A Convenção das Nações Unidas sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias (CISG) aplica-se aos contratos internacionais de compra e venda de mercadorias vinculados a mais de um ordenamento jurídico, e objetiva uniformizar a regulação jurídica sobre contratos de compra e venda de mercadorias, de modo a incrementar segurança jurídica às partes envolvidas e reduzir os custos jurídicos envolvidos nas compras e vendas internacionais.
A Convenção foi ratificada pelo Brasil em 2013, entrando em vigor em 2014, e, em 2021, foi aplicada de forma inovadora pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) na solução de um litígio envolvendo a compra e venda de milhares de caixas de kiwis, sob o fundamento de que a Convenção reflete os usos e costumes do Direito do Comércio Internacional, do qual as empresas nacionais participam ativamente.
No referido caso, uma empresa italiana ajuizou ação de cobrança contra uma empresa brasileira argumentando que teriam celebrado contrato de compra e venda de kiwis e, em decorrência deste, a vendedora teria exportado as frutas para a empresa brasileira, a qual se recusara a efetuar o pagamento da mercadoria.
O pleito da vendedora foi indeferido em primeira instância, sob o fundamento de inexistência de negócio jurídico celebrado entre as partes, uma vez que o contrato de compra e venda não fora celebrado sob a forma escrita.
A empresa recorreu ao TJSP, que, ao analisar os documentos comprobatórios juntados pela vendedora, deu provimento ao Recurso de Apelação nº 1017219-07.2017.8.26.0004, concluindo pela celebração do contrato de compra e venda com base na aplicação do Art. 11, da CISG, que prevê que contratos de compra e venda não requerem instrumento escrito, nem estão sujeitos a requisitos de forma.
Em seu voto, o desembargador Rodolfo César Milano, relator do Acórdão, consignou que, apesar de o contrato ter sido celebrado antes da promulgação da CISG, seria o caso de aplicar a norma enquanto soft law – conjunto de normas internacionais de cumprimento não obrigatório – vez que, apesar de seu caráter facultativo, reflete os usos e costumes do direito do comércio internacional ao menos desde 1980, ensejando a aplicação do Art. 113 do Código Civil brasileiro, que prevê que “os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração”.
Em conclusão, o Tribunal entendeu que embora a CISG não seja imediatamente aplicável, reflete os usos e costumes do direito do comércio internacional, de forma que sua aplicação garante maior segurança jurídica aos casos semelhantes.
Entre em contato com o Autor: Renato Trevisan, advogado
Autora: Isabela Burgo, Advogada