No início deste ano, a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo afastou a cláusula arbitral em um caso de anulação de contrato de franquia. A (in)validade de cláusula arbitral é um tema amplamente debatido, o que justifica analisarmos os argumentos levantados pela invalidade da cláusula e como o TJSP se posicionou, confirmando que hipossuficiência é capaz de afastar arbitragem, observando-se a garantia constitucional do acesso à justiça.

O Caso

Na ação, o Franqueado pleiteava pela anulação do contrato de franquia com reparação por perdas e danos e indenização pelo abuso de dependência econômica, em razão de suposto descumprimento por parte da Franqueadora de inúmeros eventos pactuados no contrato.

Citada, a Franqueadora apresentou contestação, pleiteando preliminarmente pela extinção do processo sem resolução do mérito, posto a existência de cláusula de convenção de arbitragem.

O juízo de primeiro grau, reconheceu a existência de cláusula arbitral apta a afastar a competência do juiz estatal, uma vez atendidos os requisitos do art. 4º da Lei nº 9.307/1996, extinguindo assim o processo sem a resolução do mérito. A sentença foi objeto de apelação interposta pelo franqueado, sobrevindo assim, o acórdão em comento.

Argumentos levantados para validar a competência do juiz estatal

Os argumentos do Autor para afastar a jurisdição arbitral em benefício da jurisdição estatal eram: (i) a competência do juízo arbitral é limitada a direitos patrimoniais disponíveis; (ii) a instauração de procedimento arbitral (no caso, no Centro de Solução de Disputas em Propriedade Intelectual – CSD) impõe ônus financeiro demasiadamente gravoso ao Franqueado, uma vez que os valores envolvidos em tal procedimento aproximam-se de R$ 100.000,00; (iii) o contrato de franquia e a cláusula são de adesão, de tal sorte que o franqueado não possuía a mesma capacidade negocial da Franqueadora, que poderia impor exclusividade no fornecimento de produtos e preço de vendas; (v) a natureza da cláusula compromissória no contrato funciona apenas como instrumento para estabelecer um salvo conduto para que a Franqueadora possa praticar toda a sorte de ilegalidade comercial, pois a cláusula teria apenas o condão de impedir o acesso a qualquer método de solução de conflitos dado que (v.1) o início de processos judiciais seria impedido pela existência da própria cláusula arbitral e a interpretação absoluta de sua competência, e (v.2) o início de processo arbitral seria impedido pela incapacidade do Franqueado custear a disputa ; (vi) há inúmeras ações judiciais em curso contra a Franqueadora, o que demonstra que o contrato não atende ao determinado pela lei de franquia, bem assim não existe sequer um procedimento arbitral em tramitação.

Posição do TJSP

O Desembargador Cesar Ciampolini do TJSP foi o relator do caso e conduziu o voto no sentido de acatar os argumentos pela invalidade da cláusula e anular a sentença apelada. Com base em jurisprudência do mesmo tribunal, o Desembargador concluiu que apesar da inequívoca ciência e aceite do Fraqueado acerca da cláusula arbitral, havendo hipossuficiência, destacada com o deferimento da justiça gratuita concedida no mesmo acórdão, é fato que o Franqueado não poderia suportar as despesas de uma arbitragem.

Assim, o TJSP apesar de reconhecer que a arbitragem seja uma forma de acesso ao sistema de justiça garantido constitucionalmente, verificou que acolher a validade da cláusula arbitral e extinguir o processo em decorrência desta, seria, justamente, cercear o acesso à justiça do Franqueado, posta sua demonstrada impossibilidade de suportar as custas do procedimento arbitral.

A decisão do TJSP, longe de representar uma posição majoritária dos tribunais brasileiros para afastar a jurisdição arbitral e apesar de ser passível de inúmeras críticas, é indicativa da preocupação latente dos tribunais em assegurar que as partes, em especial quando derivada de uma relação não paritária (como a decorrente de uma relação de franquia), tenham acesso a algum método jurisdicional de resolução de conflitos.


Por: Daniel Tavela Luís – Sócio 

Isabela Burgo – Advogada 

Giovana Pala – Estagiária