Por: Camila Camargo
- A Lei de Falências e Recuperação Judicial (Lei nº 11.101/2005)[1] foi elaborada com o intuito de regular a recuperação judicial, extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Embora tenha proporcionado importantes inovações ao ordenamento jurídico pátrio, a Lei, elaborada há mais de 15 anos sob uma realidade fática, econômica e financeira distinta da atual, encontrava-se, em muitos aspectos, ultrapassada.
- Dessa forma, em 23/01/2021, entrou em vigor a Nova Lei de Falências e Recuperação Judicial (Lei nº 14.112/2020)[2], com o intuito de atualizar a legislação referente à falência do empresário e da sociedade empresária, bem como da recuperação judicial.
- A Lei altera importantes dispositivos normativos a fim de assegurar maior segurança jurídica e rapidez aos procedimentos de recuperação judicial e processos falimentares, além de possibilitar a concessão de novas benesses às empresas que enfrentam dificuldades financeiras. A seguir, apresentamos as principais mudanças introduzidas pela Lei nº 14.112/2020.
- Em um contexto marcado pelas adversidades e obstáculos decorrentes da pandemia gerada pela Covid-19, a Lei nº 14.112/2020 proporciona 07 (sete) importantes modernizações ao sistema jurídico falimentar e da recuperação judicial.
- A principal mudança estabelecida pela nova Lei foi a introdução da Seção IV-A, que dispõe, conforme seus artigos 69-A a 69-F, sobre a possibilidade de o magistrado, após a oitiva do Comitê de Credores, autorizar a celebração de contratos de financiamento com o devedor, assegurados pela alienação fiduciária ou oneração de bens e direitos do devedor ou de terceiros. Trata-se de um empréstimo de risco, que depende de autorização judicial, direcionado às empresas que possuem chances de serem polpadas do processo falimentar.
- Ainda, foi introduzida a Seção II-A à Lei nº 11.101/2005, instituindo a possiblidade de a empresa devedora negociar com os credores antes do início do processo de recuperação propriamente dito. Trata-se de uma fase pré-processual em que as disputas entre os sócios e acionistas da sociedade devedora, bem como dos litígios sujeitos à recuperação judicial, poderão ser dirimidas, incentivando os métodos de mediação e conciliação para resolução destes conflitos, nos termos do artigo 20-A[3].
- Outra importante inovação trazida pela nova Lei foi a possibilidade de apresentação de plano de recuperação judicial pelos credores no prazo de 30 (trinta) dias, caso seja rejeitado o plano elaborado pela empresa devedora, segundo determina o §4º, introduzido no artigo 56 da Lei nº 11.101/2005[4].
- Essa mudança possibilitou a ampliação do diálogo entre devedores e credores a fim de que sejam formuladas propostas que assegurem um equilíbrio à ambas as partes da recuperação judicial, visto que antes desta reforma legislativa, apenas o devedor podia propor as condições de negociação, obstaculizando as tratativas entre as partes.
- A Lei nº 14.112/2020 também alterou o §4º do artigo 6º da Lei de Recuperação Judicial e Falências[5]. Agora, verifica-se que o stay period, período de 180 (cento e oitenta) dias de suspensão das ações contra a sociedade empresária em recuperação judicial, poderá ser prorrogado duas vezes, sendo a primeira mediante autorização judicial e a segunda mediante solicitação efetuada pelos credores.
- Outra importante mudança foi a introdução do Capítulo VI-A, o qual disciplina a insolvência transacional, possibilitando aos credores da empresa devedora não sediados no Brasil a legitimidade para postular diretamente ao juiz brasileiro, além de garantir o acesso aos mesmos direitos concedidos aos credores nacionais.
- Assim, nos termos do artigo 167-A, incisos I a III[6], esta atividade possibilita a cooperação internacional entre os juízes brasileiros e estrangeiros, protege os interesses de todos os credores, bem como assegura o aumento da segurança jurídica para atividade econômica e para o investimento.
- A Lei nº 14.112/2020 também inovou ao permitir que o produtor rural possa requerer a recuperação judicial. O produtor poderá apresentar plano de recuperação desde que o valor da causa não exceda R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais), nos termos do artigo 70-A introduzido pela nova Lei[7] e que comprove o exercício de atividade rural por no mínimo 02 (dois) anos, mediante a apresentação da Escrituração Contábil Fiscal, ou outro documento legal que venha a substituir a Escrituração, conforme o artigo 48, §2º da Lei nº 11.101/2005[8].
- Por fim, insta ressaltar que a Lei nº 14.112/2020 não alterou apenas disposições previstas na Lei de Falências e Recuperação Judicial. Outra importante mudança foi a introdução do artigo 10-A à Lei nº 10.522/2002[9], que aumentou a possibilidade de parcelamentos das dívidas tributárias das sociedades empresárias em recuperação judicial, podendo ser divididas em até 120 (cento e vinte) prestações, nos termos do inciso V do referido dispositivo. A mudança auxilia as empresas devedores na recuperação de suas condições financeira de forma mais eficaz e definitiva.
- Portanto, verifica-se que a Lei nº 14.112/2020 possui o escopo de assegurar alternativas de resolução aos processos de falência e recuperação judicial, visando melhores alternativas de reestruturação às empresas que enfrentam dificuldades econômico-financeiras.
- Assim, parece-nos que as alterações trazidas pela Nova Lei de Falências e Recuperação Judicial devem ser recebidas com entusiasmo, visto que contribuirão efetivamente com a preservação das sociedades empresárias, resguardando os interesses de investidores, empreendedores e de toda a coletividade.
[1] Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11101.htm.
[2] Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/L14112.htm.
[3] Art. 20-A LRF. A conciliação e a mediação deverão ser incentivadas em qualquer grau de jurisdição, inclusive no âmbito de recursos em segundo grau de jurisdição e nos Tribunais Superiores, e não implicarão a suspensão dos prazos previstos nesta Lei, salvo se houver consenso entre as partes em sentido contrário ou determinação judicial. (Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020) (Vigência).
[4] Art. 56 LRF. Havendo objeção de qualquer credor ao plano de recuperação judicial, o juiz convocará a assembleia-geral de credores para deliberar sobre o plano de recuperação. […] §4º Rejeitado o plano de recuperação judicial, o administrador judicial submeterá, no ato, à votação da assembleia-geral de credores a concessão de prazo de 30 (trinta) dias para que seja apresentado plano de recuperação judicial pelos credores. (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020) (Vigência)
[5] Art. 6º LRF. A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica: […] § 4º Na recuperação judicial, as suspensões e a proibição de que tratam os incisos I, II e III do caput deste artigo perdurarão pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contado do deferimento do processamento da recuperação, prorrogável por igual período, uma única vez, em caráter excepcional, desde que o devedor não haja concorrido com a superação do lapso temporal. (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020) (Vigência)
[6] Art. 167-A LRF. Este Capítulo disciplina a insolvência transnacional, com o objetivo de proporcionar mecanismos efetivos para: I – a cooperação entre juízes e outras autoridades competentes do Brasil e de outros países em casos de insolvência transnacional; II – o aumento da segurança jurídica para a atividade econômica e para o investimento; III – a administração justa e eficiente de processos de insolvência transnacional, de modo a proteger os interesses de todos os credores e dos demais interessados, inclusive do devedor; (Incluídos pela Lei nº 14.112, de 2020) (Vigência)
[7] Art. 70-A LRF. O produtor rural de que trata o § 3º do art. 48 desta Lei poderá apresentar plano especial de recuperação judicial, nos termos desta Seção, desde que o valor da causa não exceda a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais). (Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020) (Vigência)
[8] Art. 48 LRF. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente: […] § 2º No caso de exercício de atividade rural por pessoa jurídica, admite-se a comprovação do prazo estabelecido no caput deste artigo por meio da Escrituração Contábil Fiscal (ECF), ou por meio de obrigação legal de registros contábeis que venha a substituir a ECF, entregue tempestivamente. (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020) (Vigência)
[9] Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10522.htm